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sábado, 13 de maio de 2017

Lembrar e Esquecer



Eu já tive medo de ter Alzheimer. Pensar que em algum momento eu poderia ficar refém da minha mente, perdida de minhas memórias, esquecida de meus afetos, me enchia de pânico!
Pior que isso era só a ideia de morrer e ser enterrada. Desde pequena eu tenho medo de ser enterrada. Sei lá, vai que eu não morri mesmo e acorde presa debaixo da terra. Deus me livre! Só de pensar já sinto falta de ar. Sou muito claustrofóbica, melhor não.
Já a ideia de ser cremada é bem interessante. Virar cinzas que serão soltas do topo de uma montanha bem alta e voar livre pelo mundo é uma imagem que me traz paz. Mas não é disso que eu quero falar.

Voltemos ao Alzheimer.

Sou um tipo meio intenso, daquele que coleciona momentos fantásticos. Na verdade, eles são até prosaicos, mas vividos com tamanha entrega, que sim, são extraordinários. Moram em mim todas as minhas dores e todos os meus amores. Todos! Todos. Todos os que (não) passaram por minha vida. Meu coração é um catálogo imenso de afetos e uma amostrinha mínima de desamores. Tenho dificuldade em deixar as pessoas irem de mim, é como se eu as tivesse abandonando. E quem ama não abandona. Nunca.

Não cultivo memórias ruins. Mas algumas são como ervas daninhas: terríveis a ponto de se recusem a me deixar, se agarrando ao meu cérebro com sofreguidão. Tem também as memórias perfeitas, que de tão lindas doem por serem agora apenas lembranças.

Eita pessoa complicada!
Seria tudo muito mais fácil pra você, mulher
Se aprendesse a ser menos!
Menos emotiva, menos intensa, menos boba, menos menos.
Menos.

Somos ensinados a perdoar, não cultivar a ira. Mas realmente um pouquinho de rancor não faz mal a ninguém. Quando temos um coração distraído é comum as mágoas que nos causam irem embora sem deixar vestígios. Isso nos deixa desprotegidos! A memória da dor deixa as pessoas medrosas. Aquela paradinha do gato escaldado.

Não sei ser medrosa, é uma habilidade que preciso aprender. Odiar também é algo que não domino, nem menos guardar uma raivasinha, uma mágoa bem dosada.

Nossa, isso soa bizarro!
Eu entenderei se nessa altura você tenha desistido de ler essa coisa ou me ache uma louca.
Enfim, normal.

Ahh é, o Alzheimer. Esqueci que eu queria falar dele.

Então.
Estava refletindo que talvez não seja uma má ideia esquecer de tudo e de todos.
Não sentir saudade, não sentir arrependimento, não sentir tristeza, não sentir amor.
Não sentir.
Ou sentir, mas não se lembrar.
Olhar tudo em volta com a curiosidade de um recém-nascido, uma página vazia a ser preenchida e não relida. A gente vem atulhando nosso HD mental com tantas lembranças, que um bug pode ser a chance de formatar e se sentir mais leve, ágil.

Não sei mais se gostaria de envelhecer com toda essa bagagem emocional.
Não sei também como me livrar dela, sem perder minha essência.
No fundo o que eu queria mesmo era nunca ter magoado quem amo, porque esses sim são os pesos emocionais que não posso esquecer. E isso é injusto, pois a contrapartida é desproporcional, na medida que perdoo e esqueço todo o mal que me fazem.

Um Alzheimer seletivo seria ideal.
Quem sabe assim eu aprenderia a lembrar (esquecer) apenas daquilo que me faz mais forte.

Ser intensa é exaustivo.
Ter boa (má) memória também.
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